BC fecha acordo de leniência e livra Campos Neto de acusação; É uma irmandade do capital financeiro que se protegem
O Ministério Público Federal e a PF não devem acolher e dar como resolvido, a impunidade não pode prosperar, num país que está punindo generais golpistas. Nem farda, nem toga, nem colorindo branco, podem sair ilesos das falcatruas. Parabéns a Luiz Nassif pela matéria.
(Fonte: GGN. O Canal Pororoca reconhece a autorial integral do site sobre o texto abaixo.)
Sem divulgação, sem publicidade, sem uma nota sequer na imprensa, o Banco Central firmou um acordo de leniência com o ex-presidente Roberto Campos Neto, pelo qual, mediante o pagamento de uma multa de R$ 300 mil, ele se livrou de todas as acusações de ter participado de um esquema de lavagem de dinheiro, com provável envolvimento do PCC.
Entenda o que ocorreu.
Peça 1 – a Operação Colossus
Em setembro de 2022 a Polícia Federal, com apoio da Receita Federal, deflagrou a Operação Colossus, para apurar suspeitas de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e associação criminosa, relacionadas com operações de criptomoedas no período de 2017 a 2021.
As investigações tiveram origem em um Relatório de Inteligência Financeira, a partir de movimentações bancárias suspeitas ligadas à negociação de criptoativos. Foi detectado que o esquema envolvia remessas de valores superiores a R$ 18 bilhões para o exterior em países como Estados Unidos, Hong Kong e Singapura.
Não era pouca coisa. Os cabeças do golpe se valiam de documentação falsa para ocultar a origem nacional dos recursos. Foram contabilizadas 68 empresas de fachada. Um dos operadores, denominado de “Rei do Cripto” foi preso ao desembarcar em Dubai com R$ 13 bilhões sem registro fiscal. A suspeita é que seria dinheiro movimentado pelo PCC.
Da Colossus nasceram as operações Aluir, em agosto de 2024, e Sibila, em setembro de 2025.
Cinco instituições financeiras entraram na linha de fogo: o Master, Genial, Travelex, Banco de Câmbio S/A, Haitong Banco de Investimento do Brasil S/A e a jóia da coroa: o Banco Santander. Mais que isso, o responsável pela área de câmbio: Roberto Campos Neto, que iniciou as operações e, depois, saiu do banco para assumir a presidência do Banco Central do Brasil.
O esquema foi denunciado por outros quatro bancos e uma corretora de valores, que recusaram participar do golpe.
Peça 2 – o Banco Central muda o regulamento
A Operação Colossus foi deflagrada em 22 de setembro de 2022. A conclusão da PF foi a de que houve uma “cegueira deliberada” da parte dos bancos. Em outras palavras, a cumplicidade dos bancos. Pela legislação em vigor, havia a responsabilidade compartilhada do banco e dos clientes, em relação às informações divulgadas sobre cada operação.
Em 2021, porém, o Congresso promulgou a Lei no. 14.286, modificando a lei do câmbio. Uma das medidas ampliava os poderes do Banco Central para regular o mercado de câmbio, incluindo a autorização para instituições autorizadas a remeter recursos para operações no Brasil e no exterior.
Já sob a direção de Campos Neto, o que fez o BC?
Antes, o setor era regulado pela Resolução que definia responsabilidades para as instituições financeiras, com exigências como cadastramento de clientes, comunicação de operações suspeitas, manutenção de registros).
Em 31 de dezembro de 2022, último dia do governo Bolsonaro, o BC divulgou a Resolução 277. Por ela, a responsabilidade de definir a finalidade da operação passou a ser apenas do cliente. Ou seja, se um membro do PCC procurasse o banco e declarasse que a remessa seria para a Ordem das Senhoras Católicas, e o banco não informasse o COAF ou a Receita, não aconteceria nada com ele.
As vulnerabilidades abertas eram óbvias:
- Risco de contratos “livres” sem substância documental — cláusulas vagas ou omissas podendo mascarar operações suspeitas.
- Seletividade na comprovação — instituições poderiam exigir documentos conforme “avaliação de risco”, o que pode levar a diferenciações que mascaram práticas ilícitas.
- Capacidade de fiscalização do BC — dependerá de sistemas de monitoramento e ferramentas de cruzamento de dados em tempo real.
- Transição normativa — abria brechas para contratos antigos, operações em curso.
Essa mudança, tirando a responsabilidade do banco, livrou todos os envolvidos – incluindo o Santander e seu diretor Campos Neto – de qualquer investigação criminal. Abortou a operação.
Peça 3 – o acordo de leniência de Campos Neto
Agora, completa-se o ciclo.
No dia 2 de junho passado, o BC celebrou um acordo de leniência com Roberto Campos Neto que, pela módica quantia de R$ 300 mil, livra-se de qualquer desdobramento civil ou criminal.
O acordo é um presente de Natal. Constata-se a falha no compliance cambial. Nem se mencionou o fato das operações serem tão suspeitas que foram rejeitadas por 5 instituições financeiras.
O acordo prevê
- Pagamento de contribuição pecuniária ao Banco Central (valor definido nas cláusulas seguintes do termo);
- Encerramento do processo sancionador, sem confissão de culpa ou reconhecimento de ilicitude, conforme art. 14, parágrafo único, da Lei nº 13.506/2017;
- Reconhecimento formal das falhas administrativas e compromisso de colaboração com o BCB.
Simples assim. Houve o encerramento dos processos, sem admissão de culpa, sem inquérito, sem processo.