Congresso derruba maioria dos vetos de Lula ao projeto do licenciamento ambiental
(Fonte: O Valor.)
Em mais uma derrota para o governo e em meio à escalada da crise política, o Congresso Nacional derrubou nesta quinta-feira (27) a maioria dos 63 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto de lei do licenciamento ambiental. Todos os 52 vetos analisados foram derrubados em dois blocos de votação e nenhum mantido: primeiro os parlamentares derrubaram 24, e na sequência mais 28 – os 11 restantes foram adiados para análise posterior. Tanto na Câmara quanto no Senado, a maioria dos parlamentares votou pela derrubada.
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Com isso, passa a valer, em grande parte, a nova lei geral do licenciamento, aprovada em julho pelo Legislativo, alvo de duras críticas de ambientalistas e de alas do governo como o Ministério do Meio Ambiente. Antes mesmo da votação de hoje, partidos de esquerda já se preparavam para entrar na Justiça contra a proposta, apelidada de “PL da Devastação”.
O movimento de derrubada se deu, sobretudo, por força da bancada ruralista e setores empresariais contrários aos vetos. Eles defendem que o licenciamento seja simplificado e agilizado diante da demora na emissão de licenças pelos órgãos ambientas no país.
“Não há flexibilização. Risco ambiental nenhum está sendo causado. Não é uma questão de simplificação, é uma questão de racionalização e modernização”, disse o deputado Zé Vitor (PL-MG), que foi relator do PL na Câmara.
Há três semanas, uma sessão conjunta do Congresso chegou a ser convocada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), mas o governo conseguiu adiar para depois da COP30, que aconteceu em Belém (PA). Nos últimos dias, houve até uma tentativa do Executivo de construir um acordo, mas fontes dizem que o clima de desgaste entre Davi e o governo prejudicaram qualquer consenso.
Antes de anunciar o resultado da derrubada dos primeiros 24 vetos, Alcolumbre pregou “responsabilidade ambiental”, buscou justificar a votação e disse que a sessão conjunta do Congresso é mais um passo para “destravar” o tema do licenciamento ambiental no Brasil.
“Qualquer tentativa de transformar esse veto [ao PL do licenciamento ambiental] em disputa política, desconsidera o papel do Congresso Nacional”, disse o presidente do Senado. “Votar esse veto é fundamental para destravar o tema do licenciamento ambiental como um todo, estabilizando o marco legal, dando previsibilidade jurídica e permitindo que o Congresso avance nas demais matérias.”.
Pessoas a par das negociações viram o clima ruim do Legislativo com o Planalto influenciar na falta de acordo referente aos vetos do licenciamento. Elas avaliam que, mesmo com uma tentativa de construção de acordo, o enfraquecimento do governo teria dado confiança para a bancada da agropecuária, que tem maioria no Congresso, levar os vetos a voto.
Entre os vetos mais sensíveis à área ambiental do governo, que foram derrubados, está o que rejeitou a criação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para projetos de médio impacto ambiental. Trata-se de uma licença autodeclaratória que não depende de análise e aprovação de órgão ambiental para que uma obra ou projeto seja executado. O governo vetou e enviou ao Legislativo um projeto de lei prevendo a LAC, mas apenas para empreendimentos de baixo impacto. Mas a oposição derrubou hoje.
Outro veto do Executivo derrubado hoje é um que trata da autonomia dos Estados para licenciar empreendimentos. Na visão da área ambiental do governo, o PL sem os vetos retirava poder da União, principalmente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais e Renováveis (Ibama) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) no processo de concessão de licenças ambientais. Com a derrubada do veto, os Estados passam a ter mais poder de competência sobre o licenciamento.
Outro ponto derrubado foi um veto ao artigo que dispensava licenciamento ambiental para produtores rurais com Cadastro Ambiental Rural (CAR) ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais. Agora, os produtores serão dispensado de licenciamento mesmo com pendências no CAR.
E por fim, uma questão que gerou muito embate, o Congresso também derrubou um veto que impedia que órgãos intervenientes do processo de licenciamento, como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), não fossem mais consultados em processos de licenciamento em áreas não demarcadas. “Não faz sentido a Funai participar de modo vinculante em áreas indígenas não homologadas”, avalia ele.
A base governista reagiu com fortes críticas à derrubada dos vetos e prometeu recorrer à Justiça. O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), classificou a derrubada como “o maior retrocesso da legislação ambiental” e disse que o governo irá buscar reverter alguns vetos derrubados acionando o Supremo Tribunal Federal (STF).
“E tem matérias que eu acho que são extremamente condicionantes. A Mata Atlântica, por exemplo, é um bioma protegido pela Constituição, nós não podemos vulnerabilizar a Mata Atlântica a despejo da Constituição. Consultar indígenas e quilombolas sobre empreendimentos em seus territórios está previsto explicitamente na Constituição.”
“Esse projeto virou uma vergonha internacional e é um verdadeiro retrocesso na defesa do meio ambiente”, também afirmou a senadora Liziane Gama (PSD-MA).
Vetos adiados
Os únicos vetos não votados foram os relacionados à Licença Especial Ambiental (LAE), nova licença criada justamente no PL. O novo dispositivo foi idealizado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), para acelerar o licenciamento de empreendimentos estratégicos para o país, desde que aprovados por um Conselho de Governo.
Em agosto, o governo vetou esse ponto, mas encaminhou ao Congresso uma Medida Provisória (MP) prevendo a LAE, mas apenas em modelo trifásico (obedecendo às três etapas atuais de licenciamento) e não no regime monofásico (apenas uma fase) como foi aprovado no PL em meados do ano.
Num acordo com a liderança do governo no Congresso hoje, os parlamentares adiaram a discussão da LAE para a medida provisória (MP) editada pelo governo, que trata sobre o tema. A MP, no entanto, expira dia 5 de dezembro, e ainda precisa ser votada em comissão especial e nos plenários da Câmara e do Senado.
