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Jornalistas abandonam Pentágono em massa após imposição de regras limitativas à sua liberdade de informar

Cerca de 50 jornalistas abandonaram esta quarta-feira o Pentágono, depois de fracassadas as negociações com a equipe responsável pela comunicação do Ministério sobre as novas regras para a cobertura de assuntos relacionados com a Defesa.

As principais marcas americanas de comunicação social mostram-se unânimes na crítica ao Ministério da Defesa norte-americano, liderado por Pete Hegseth, depois de terem recebido deste departamento novas “regras” para o acompanhamento do que se passa no Pentágono. Em consequência, dezenas de repórteres entregaram os seus “passes” de acesso ao edifício e decidiram abandonar os seus postos, em protesto.

A revisão das diretrizes, que o Pentágono diz ser apenas “senso comum”, pressupõe, por exemplo, limites aos locais onde os jornalistas podem ir sem um acompanhante do Ministério e enviam “uma mensagem de intimidação sem precedentes” a todos os que, dentro do Ministério, possam desejar falar com um repórter sem autorização prévia de Hegseth ou de alguém da sua equipe, denuncia a Associação de Jornalistas do Pentágono em comunicado.

Estava também prevista a retirada dos passes a jornalistas que escrevessem sobre informação que o Ministério não disponibilizou anteriormente, o que seria o equivalente a anular a investigação jornalística que, por definição, é a publicação de material que não está disponível ao público, mas que normalmente se debruça sobre problemas no funcionamento de instituições com influência na vida dos cidadãos.

O Ministério diz que a reação é exagerada, que os repórteres podem continuar a fazer as perguntas que quiserem e que a assinatura das novas regras é apenas uma garantia de que todos as leram, não que tenham de as cumprir. Sean Parnell, porta-voz-chefe do Departamento de Defesa, escreveu nas redes sociais que “os jornalistas não são obrigados a consultar [os responsáveis do Ministério] antes de publicarem as histórias” e que “mantêm amplo acesso aos escritórios de relações públicas, à sala de imprensa e à possibilidade de fazer perguntas”, as quais “continuarão a ser respondidas de forma criteriosa”.

A única mudança, esclarece ainda, “é uma atualização há muito esperada no processo de acreditação, que não era revisto há anos, se não décadas, para se alinhar aos padrões de segurança modernos”.

Os jornalistas veem as coisas de outro prisma. E também os académicos que estudam lei da liberdade de imprensa. Um deles, David Schulz, diretor do Departamento de Liberdade de Imprensa e Acesso à Informação da Faculdade de Direito de Yale, falou à PBS sobre o caso. O problema, disse, “é que àquilo que Pentágono chama solicitação ilegal de informação, nós chamamos recolha de notícias”.

Além disso, “o Pentágono está exigindo, pela primeira vez, que os repórteres afirmem por escrito que compreendem que a segurança nacional é prejudicada pela divulgação de informações que o Pentágono não aprovou para divulgação, mesmo que essas informações não sejam confidenciais. Sabemos que isso não é verdade. Mesmo informações confidenciais podem muitas vezes ser divulgadas sem causar danos, e o interesse público às vezes obriga à sua divulgação”, argumentou Schul, acrescentando que este novo documento que os jornalistas teriam de assinar tem escrito, logo no cabeçalho, que pode ser usado pelo Pentágono em tribunal e que a quebra das regras não poderia ser justificada com a Primeira Emenda, que estabelece a liberdade de imprensa e de requisição de informação.

A Associated Press descreveu, num artigo sobre o último dia dos repórteres no Pentágono, o momento em que os jornalistas saíram do edifício em protesto. “À medida que a hora se aproximava, caixas de documentos alinhavam-se num corredor do Pentágono e os repórteres iam transportando cadeiras, uma fotocopiadora, livros e fotos antigas para o estacionamento, resquícios de espaços de trabalho repentinamente abandonados. Pouco depois das 16 horas, 40 a 50 jornalistas saíram juntos após entregarem os crachás”, lê-se na notícia da agência.

“É triste, mas também estou muito orgulhosa da imprensa por termos permanecido unidos”, disse Nancy Youssef, repórter da revista “The Atlantic”, que tem uma escrivaninha no Pentágono desde 2007. Com ela levou um mapa do Oriente Médio.

Donald Trump apoia o seu ministro, e nisso não houve qualquer surpresa, uma vez que o Presidente dos Estados Unidos sempre manteve uma relação confrontacional com a imprensa que não publica o que ele considera ser a versão justa dos eventos. “Acho que ele considera a imprensa muito perturbadora da paz mundial. A imprensa é muito desonesta”, disse Trump, em declarações aos jornalistas na Casa Branca na terça-feira.

O próprio Presidente já moveu vários processos contra meios de comunicação social, tem um grupo de repórteres autorizado a cobrir os seus eventos, enquanto deixa de fora outros, e já se recusou a responder a perguntas de certas estações ou jornais como sanção ou castigo pela cobertura jornalística, como aconteceu recentemente com a ABC, depois de um dos seus jornalistas ter perguntado ao vice-presidente, JD Vance, se o responsável pelas fronteiras tinha ou não recebido um suborno, e o governante se ter recusado, por cinco vezes, a responder.

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