Derrite deturpa proposta do governo e radicaliza PL Antifacções
Fontes: G1, Agência Brasil, Carta Capital.
Substitutivo apresentado pelo deputado do PP-SP desfigura proposta do governo, amplia poder policial e aposta na repressão, em vez da cooperação e inteligência.
O texto original do governo, enviado ao Congresso no fim de outubro, cria a figura da facção criminosa, com pena de 8 a 15 anos de prisão.
A proposta também amplia instrumentos de investigação e bloqueio de bens, autoriza infiltração de agentes e rastreamento financeiro e de dados digitais, e prevê o afastamento de servidores públicos ligados a facções.
O projeto foi construído ao longo de mais de um ano pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, com a participação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), do Ministério Público, da academia e da sociedade civil.
O texto do Executivo buscava fortalecer a cooperação entre os entes federativos e aprimorar os mecanismos de inteligência, investigação e prevenção ao crime organizado, com foco na integração de dados e políticas sociais em territórios vulneráveis.
O substitutivo apresentado pelo deputado e ex-secretário de Segurança de São Paulo, Guilherme Derrite (PL) representa uma mudança profunda de sentido em relação à proposta original.
O texto de Derrite abandona a ênfase na integração e aposta na lógica do endurecimento penal, ampliando o poder policial, a tipificação de crimes e a possibilidade de uso de instrumentos excepcionais de repressão.
Na prática, a proposta reforça o modelo de segurança pública militarizada e reativa, que há décadas mostra resultados limitados no enfrentamento da violência.
O parecer de Derrite condiciona as investigações conjuntas da Polícia Federal (PF) com forças estaduais sobre crimes relacionados a facções criminosas a um pedido formal do governador.

“Quando houver repercussão interestadual ou transnacional dos fatos, potencial de afetar a segurança nacional ou de desestabilizar a ordem pública internacional, poderá o Ministério da Justiça e Segurança Pública, mediante provocação do Governador do Estado, determinar a atuação conjunta ou coordenada das forças policiais federal e estaduais”, diz o projeto.
Na opinião do Secretário Nacional de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, o o parecer do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) no chamado PL Antifacção pode provocar uma “hecatombe” no combate ao crime organizado, segundo publicado por Carta Capital.
A preocupação recai sobre um trecho do substitutivo de Derrite que altera as competências de investigação das organizações criminosas. Conforme o texto, a Polícia Federal só poderia agir nesses casos “mediante provocação do governador”, transferindo a maior parte das apurações para órgãos estaduais.
De acordo com Pereira, o dispositivo abre caminho para livrar os líderes de facções que, “com bons advogados, poderiam postergar apurações por muito tempo apenas discutindo a competência de quem está investigando”. Ele vê também o acréscimo de um “critério político” no sistema de Justiça, o que não existe atualmente.
Em entrevista à Agência Brasil, o professor de direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Rodrigo Azevedo, associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, avalia que a mudança é um retrocesso que limita a atuação da PF contra o crime organizado.
“É um retrocesso. Esse parágrafo cria uma dificuldade, um entrave, tanto que essa atuação da Polícia Federal vai depender de uma provocação do governador. [O texto] de uma forma absolutamente genérica. Então não há como garantir com isso a mínima segurança jurídica em relação a essa previsão de para quais situações isso se coloca”, explicou.
Na avaliação do especialista, a medida vai no sentido oposto da PEC da Segurança, enviada pelo governo federal, que prevê maior integração entre as forças de segurança.
O líder do PT na Câmara, deputado Lindberg Farias (PT-RJ), sustentou que a mudança busca impedir a atuação da PF, o que, segundo ele, inviabilizaria investigações como a Carbono Oculto, que teve como alvo a lavagem de dinheiro do crime organizado.
“Em vez de fortalecer o combate ao crime organizado, o relator faz o oposto: tira poder da PF, protege redes de lavagem e impede a cooperação direta entre polícias, na contramão do que foi proposto na PEC da Segurança”, afirmou Lindberg em uma rede social.
Em reportagem publicada pelo G1, o secretário nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, afirmou que o parecer do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) sobre o projeto de lei antifacção “banaliza o terrorismo” e pode “desestabilizar todo o sistema penal e processual brasileiro”.
“Eles, na verdade, recuaram naquela ideia inicial de transformá-las efetivamente em terroristas, mas procuraram equipar a ação, quase que banalizando as ações terroristas”, disse Sarrubbo em entrevista ao programa Em Ponto, da GloboNews.
“Terrorismo, em qualquer país do mundo, é uma exceção para determinadas circunstâncias e não para qualquer atividade criminosa. E aqui se banaliza o terrorismo, de tal forma que a lei ficou com muitos artigos, com inúmeras situações, e eu insisto, o grande problema dessa proposta é que ela vai desestabilizar todo o sistema penal e processual brasileiro”, afirmou ainda Sarrubbo.
O governo pede diálogo antes da votação do projeto.
“Eu não peço para não votar, eu peço para abrir o diálogo. Uma legislação dessa envergadura, uma legislação dessa importância, ela precisa de maior diálogo”, afirma o secretário.
